Saturday, September 30, 2006

a chave da porta



toda vez que entro em casa, rodo a chave na maçaneta, paro antes de tocar o trinco. reflito a sua presença com muito mais ânsia do que o pensamento da labuta diária que me acompanha. nem a minha agenda marcada com borrões de várias cores de caneta me descompensa tanto quanto a sua ausência. perceber a sua ausênica depois de ter girado a chave no trinco da porta me esvazia. o dia não apresenta lógica e nem sentido mesmo quando tinha que enfrentar uma alcatéia faminta e sedenta.

são alguns segundos que me consomem e fazem rodar a ciranda do meu pensamento. aonde estaria o corpo que essa noite foi campo da minha força? com a mesma obsessão ordinária que faz parte do meu cotidiano, mando que meus cães farejadores sigam o seu cheiro para te trazer de volta. sei que consumo o ar que está ao seu redor. mas não me culpe pelo excesso e delinqüência. só aprendi a te amar como um selvagem. li na sua cartilha que para saber te amar teria de ser um aborígene. e religiosamente me cedi aos seus mandamentos.

chegava a perguntar a outras almas o motivo dessa vida. todas as tardes me retalhava com a tesoura que me impunha, não sabia que tinha gosto de ver meu sangue escorrendo pelos meus dedos e caindo aos seus pés. sem se incomodar com o estrago, te via apenas com um sinal de adeus configurado em suas mãos. meus olhos te esfaquiavam com injeções de veneno. foram várias as situações que quis te matar. mas te matando, certamente morro antes. o projétil vai rasgar a sua carne e atingir as minhas veias.

em cada uma das suas encenações, eu me anulava. rezava para os santos e aclamava aos orixás para que minha estrutura fosse de ferro e que minha palavra fosse lavrada. nunca consegui, me rendia a meia dúzia de palavras ensaboadas ditas quando a sua língua trafegava pelo meu corpo. delirava quando ao terminar de rodar a chave no trinco, uma taça de vinho e uma porção de tesão me aguradava para guerriar. mesmo sabendo que essa era uma façanha do seu corpo depois uma noite regada a desentendimentos, eu te contemplava com meus gemidos. não fazia permutas e nem concessões para que tomasse posse da minha pele e fizesse dela um território particular.

fazia do meu papel um infinito de fantasia. eram máscaras, fitas, adornos e adereços para festejar a nossa guerra. retribui o seu suor com minha saliva que aniquilava a sua temperatura. era fêmea, era macho e tudo que poderia ser. eu me debruçava sobre a sua criatividade e me esquecia de quando girava a chave e encontrava um pedaço de papel rabiscado carregado de desculpas.

queria ser diferente de tudo que até hoje me apresentei. escrevi outros roteiros para a minha vida para que outros atores a representasse. em algumas cenas me faltava a histeria do momento de girar a chave no trinco da porta. a vida me parecia uma sala de espera repleta de revistas amassadas. a monotonia daquilo que não está pronto e nem tem pressa de ser. o tempo dissolvia as minhas horas. o meu pensamento não tinha mais sabor. descubri que precisava da sua carne para me alimentar. era prioridade realizar um banquete de orgias para nutrir a minha passagem pela terra.

mas serei diferente. desarmado é mais fácil de pedir um momento de paz que esse amor até hoje desconhece. contarei infindáveis luas e sóis para não te amar pela metade. continuarei fiel àquilo que do berço me foi ensinado, porém a carcaça de soldado a fundirei na fogueira da sua vaidade. pare com suas concessões e me ame. ame aquele que nunca te faltou, ainda mais nas noites de sábado. não tenho lugar, não encontrei outra maneira para manter a chave da porta.

Sunday, September 17, 2006

Minha labuta
Acordei,
trabalhei.
Sem graça,
dormi.

Wednesday, September 13, 2006




o dia me presenteou com a sua imagem. perplexo e desatento não foi possível esconder a agonia. em forma de histeria, cada parte de você foi acoplada em minha mente. eu te culpo pela invasão e devastidão. meu silêncio foi arrebentado com a configuração de sua imagem.

me quebrei em pequenos pedaços. fui me recompor no chão. cada pedaço de mim foi reconstiutído com minha própria saliva. precisava voltar à minha carne sem provocar desconfiança a ninguém. comecei pelas artérias. uni os tubos do coração a outras partes do meu corpo. precisava sentir o sangue circulando. fazer me esquentar.

nessa operação, uni o meu sexo ao que restou de mim. viril e ágil. iria enlouquecer ao saber que para outros você poderia abrir as pernas. jamais suportaria a idéia de saber que não seria meus os seus pêlos. que não era a minha fotografia que traria em sua carteira ou adornando a sua mesa de trabalho. o meu ciúmes, esse cão selvagem, responde por aquilo que não tive culpa.

refiz as minhas mãos, braços, pernas e dedos. nesse acidente você levou a minha identidade, como posso agora viver sem impressões digitais e dizer que eu sou eu e não você? não vou sair pela rua questionando os andarilhos quem era eu sem você. você me entorpeceu. rodei em carrosséis de cavalos alados que me levaram às franjas do mar. uma tentativa de matar a sede mesmo com a água salgada. tudo me secou.

por fim a minha cabeça. com outros neurônio para não destinar meus pensamentos com exclusividade a você. não que não os merceça, mas preciso respirar. preciso acreidtar que fora do nosso universo um outro planeta gira com a ânsia de um guerreiro.

Wednesday, September 06, 2006

minha recompensa



nessa noite eu quero a minha recompensa. a preço de ouro, você irá devolver cada centavo do seu crime ao meu ego. quero ver o vil metal se debruçar um sobre o outro até construir um arranha-céu que os olhos não vão alcançar. o monumento vai se perder nas nuvens e incomodar são pedro. coloque-os em cima da mesa. mesa essa que foi palco da sua anarquia, da sua farra até mesmo do seu descanso quando o álcool lhe impunha o sono, se negando a deitar ao meu lado.

tive que disputar o seu tempo até com uma mesa. esse móvel talvez seja a parte mais marcante da sua vida. era sobre ele que você despejava doses de cólera depois de um dia fatigado. a sua mão pesada agredia com estupidez a face polida da madeira, deixando um rastro de pele e suor que sempre lhe escorria dos braços e da testa. podia se ver a olho nu as marcas da sua mão desenhadas sobre o móvel. sua mão imprimia sobre a mesa um labirinto de linhas e impressões.

as suas cenas não me importam mais. já nem sei que sabor tem. pague me o que me é de direito. conte as moedas que carrega dentro do bolso. esse miúdo dinheiro que foi troco de um maço de cigarro ou de um gole de cachaça em algum boteco miserável. ao menos honre com dinheiro aquilo que a sua frágil palavra nunca honrou. e se hoje não me pagar, apelo para imponência dos juros. vou sugar a sua vida com um canudo de orgulho que em alguma rua deixei afogado em um copo de cerveja. esqueci as suas promessas e a sua sedução. para que assim, pudesse exigir o que me deve. estou com pressa, desembolse as suas economias que com tanta avareza construiu.


se está descapitalizado, vou te dar uma trégua. a última chance de ficar quite com a sua consciência. arque com as despesas do meu coração. essa víscera pulsante que agora está dentro de uma bacia com água e gelo em cima da mesa, uma tentativa de amenizar a temperatura . um enfarte fulminante me dilacerou ao ver o seu corpo se roçando em outro pêlos. pobre diabo. ser ínfimo de qualidade duvidosa. para ocupar meu coração não lhe cobrei aluguel. o seu espírito posseiro invadiu esse músculo vital. com o seu pagamento posso agora pedir que as cartas sejam entregues a outro amores. a outras pessoas que não se alimentam do meu sangue e da minha dúvida.

Monday, September 04, 2006

anjo torto



deus já me fez torto. colocou para me guiar um anjo igualmente torto. um ser que voa com a asa quebrada e com alguns graus de miopia. trôpego e risonho. não carrega auréola e nem as batinas celestiais. em nome de seu prazer, o anjo alega que é o arsenal é pesado. seus cabelos não são amarelos como a cor do sol e nem tão pouco cacheados. careca por opção, rebelde por necessidade.

esse é meu anjo. se esconde em uma nuvem preguiçosa, longe de qualquer lugar. a longa distância é proposital. "quando me chamarem, chamem baixo. para eu não ouvir", alega o pequeno enviado à terra. "peça desculpas a pedro, o dono do céu. é que o ócio me acompanha.", se explica sem se ruborizar.

vire-se de lado, aconchegue o seu espaço e deite-se em berço esplêndido. se não conseguir, peça ajuda a hypos ou a morfeu. mesmo sendo de outra cultura, eles não te negarão apoio. mesmo sendo guache e levando a vida com desvio. rezei na sua cartilha que chronos me reserva o poder de ter tempo.